Em 1968, no vigor dos 16 anos, um anônimo entre centenas de estudantes que queriam mudar o Brasil, resolvi que queria ser jornalista. Em 69 bati à porta do Jornal do Piauí, onde fiquei como auxiliar de revisor. Em 70 já estava sugerindo notas e artigos. Lutei pela liberdade de expressão sentado no banco dos réus. Guardo uma lista imensa de coisas planejadas e algumas realizadas. Espero que esta nova incursão, manter um blog sempre atualizado, seja duradoura.
quarta-feira, março 15, 2006
TIPO ASSIM ULTRAPASSADO
Descobri com espanto mas conformado, que sou de outra época. O alerta veio de minha filha, Thissiane, que resolveu, num misto de homenagem e bem querer, seguir a minha profissão de jornalista. Só que pelo caminho inverso. Ao invés de tentar aprender in loco, começando como revisor e indo aos poucos passando pelos processos de composição até chegar à redação, entrou na Universidade Federal no curso de Comunicação Social. Sou mesmo de outra época.
Mas como eu ia dizendo, com um ano e meio de curso ela me procurou para auxilia-la em um trabalho sobre televisão. Meti os pés pelas mãos: quis explicar o começo de tudo, a época em que a TV era em preto e branco. Ela, muito prática, contra-argumentou na hora: “papi, daqui a pouco você vai querer me convencer que o mundo era em preto e branco. Como pode? Você só tem cinqüenta anos e ainda é desse tempo?”
Foi difícil convencê-la de que o mundo andava em marcha lenta até ontem e que a pressa da juventude acelerou tudo. Tem cada bebê chorão fazendo genialidade que nem dá para contar. E isto me lança mais ainda para uma outra época.
Sou do tempo da máquina de escrever, da cópia em carbono ou e da cópia em mimeógrafo a álcool. Sou do tempo em que o carro da moda era o Fusca de estribo e com pára-choque niquelado. Andei de Simca Chambord, dirigi um DKW (pronunciava-se decavê), um Aero Willis e também o Gordini. Sou do tempo em que pesquisa se fazia em bibliotecas públicas, espirrando sobre enciclopédias e livros especializados com páginas enceradas pelo sebo do manuseio.
Claro que não tenho motivo para ter saudade dessas coisas ultrapassadas. Adaptei-me ao novo, ao moderno. Mas às vezes sinto cansaço em comemorar hoje o aprendizado de uma nova tecnologia e acordar no outro dia lendo que tem uma atualização. E lá se vão horas de novo aprendizado para se adaptar à nova atualização da próxima semana.
Só há uma coisa que não consigo aprender do mundo moderno: a linguagem versátil da garotada. Bisbilhoto vez por outra os grupinhos formados nos shoppings e cantos da moda. Não consigo acompanhar as conversas. Acho que só consegui, por exemplo, descobrir o que significa “tipo assim”. Deve servir para muita coisa porque é sempre a expressão mais usada.
Não estou brincando. Aliás vou reproduzir uma conversa rápida, ouvida da mesa ao lado, entre dois adolescentes:
- ... Deu pedal lá, cara?
- Deu, mermão. E a gata é... tipo assim... demais.
- Demais mesmo, né?
- Bicou legal, tipo assim... tudo a ver...
E se mais não assimilei é porque nada entendi do diálogo. O que seria o “demais mesmo, né”? E o “bicou legal”? “Tipo assim” já entendo como qualquer coisa. Bem, o que vale é que os dois se comunicaram. Pelo menos eu acho que sim.
Tenho uma amiga mãe de um lindo garoto de doze anos, gênio em computador segundo ela. Passa horas “pesquisando” e trocando informações com os amiguinhos, via ICQ (imagino que deva ser uma ferramenta para diálogos digitais – se é que isto seja possível). Ela ficou revoltada porque em uma prova de redação o espertinho perdeu pontos. Não foi compreendido pelo professor.
Segundo ainda a minha amiga, o filho querido apenas usou a linguagem jovem. Tipo assim: vc, trank, d+, ñ, tmb, nunk. O professor naturalmente não quis perder tempo para descobrir que estas coisas aí provavelmente significam, pela ordem, você, tranqüilo, demais, não, também e nunca.
Estou ultrapassado! Tipo assim muito assustado. Desconfio seriamente que logo logo vou precisar de tradução simultânea para conversar com os meus netos. E se as redações forem invadidas por esta geração comunicativa, genial, que descarta as boas palavras que ainda teimo em usar e compreender como necessárias, como farei para me informar e entreter?
Tem razão a minha filha. Eu fui criado em um mundo em preto e branco.
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ResponderExcluirSó pra concluir: Também não se “apoquente” em aprender tudo o que falam por aí, principalmente a linguagem dos jovens. Como bem diz o nome “é dos jovens” e vc pensa que eles querem algum adulto metido na sua “tribo” ? De jeito nenhum. Seja paciente. Isso passa! Tudo passa! Ou vc vai me dizer q também já não foi jovem um dia, hein?
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